sábado, 11 de julho de 2009

Itinerantes do Reino, desmascarando os demônios da dependência (Mc.6,7-13)

Hoje, como ontem, Jesus chama e envia ‘todos’ (doze) aqueles que estão dispostos a tornar visível a Realeza de Deus para expulsarem os espíritos impuros do antirreino. Os ‘doze’ representam simbolicamente as 12 tribos de Israel quase todas dispersas e a necessidade de reagrupá-las criando uma nova nação/humanidade.
Parece ser esta a principal dica que Jesus dá aos seus enviados: destruir os espíritos que mantêm escravos os filhos e filhas de Israel (humanidade). ‘Espírito impuro’, com efeito, é tudo o que se opõe à realeza próxima de Deus. Quem é movido pelo espírito de Deus, que é vida e liberdade, tem a obrigação/missão de identificar os espíritos/forças que criam morte e dependência nas pessoas e na nação/humanidade, e destruí-los. Eles tinham nomem concretos à época de Jesus: dominação romana e religiosa (templo), discriminação social e litúrgica (pureza legal), medo e complexos de culpa, injustiça social e omissão nacional perante tudo o que está desagregando a nação/humanidade.
Esse anúncio/testemunho, segundo Jesus tem características metodológicas bem peculiares:

1. ‘Dois a dois’: longe de ser um conselho para a própria segurança pessoal, o fato de ir 'dois a dois' aponta para a dimensão comunitária do anúncio, para que ele seja eficaz.

2. ‘Nem pão, nem mochila, nem dinheiro, nem duas túnicas....’: manifesta não somente a assunção de um ‘estilo sóbrio, desprendido e essencial’ (atitude ascética), mas esses conselhos metodológicos querem ser coerentes com o conteúdo do anúncio e estar em sintonia com as condições de vida, o ambiente social e cultural e as expectativas com as vítimas do antirreino. Sinalizam, de um lado, que a centralidade é o conteúdo/prática do anúncio, e não a pessoa que prega/anuncia, ou seja, o seu poder pessoal ou institucional; e do outro lado, asseguram que para quem se coloca a serviço do anúncio da realeza de Deus sempre haverá quem lhe dará o necessário para viver, ou seja, a gratuidade dos anunciadores encontrará reciprocidade nos que acolhem a mensagem.

3. ‘...na casa em que entrardes, ficai nela até partirdes dali...:Jesus deixa claro, ao mesmo tempo, que o seu grupo é um grupo itinerante, a caminho, em busca permanente das pessoas, das vítimas do antirreino e desejosas de vida plena. Os anunciadores/as de Jesus não são funcionários e assalariados da religião oficial e de suas estruturas. Contrapõe-se, assim, à visão e prática de quantos achavam que se servia a Deus exclusivamente num templo ou numa sinagoga, mediante ritos e sacrifícios e esperando que as pessoas fossem até eles. Jesus tem clareza que se não houver uma ‘mobilização nacional’, a partir do corpo-a-corpo, celebrando e saboreando a alegria de viver e lutar na intimidade familiar (a casa), com visitas, convivências e articulações em larga escala, a realeza de Deus não seria possível!

4. ‘...e quantos não vos receberem, sacudi o pó...': o anúncio da realeza de Deus é sempre proposta. Jamais poderá se transformar numa imposição, lançando mão de ameaças e chantagens morais de qualquer tipo. É convite, é oferecimento gratuito de que adesão à ‘força-tarefa’ em favor do novo jeito de governar de Deus poderá redundar em vida plena e liberdade para toda a humanidade. Entretanto, Jesus quer deixar claro que o seu grupo aderiu a isso, assumiu a responsabilidade de seus atos, e deixa claro que os que se recusam ou se omitem em trabalhar em favor de um novo Israel/humanidade terão que arcar com as conseqüências de suas escolhas.

Acredito que temos nesse trecho evangélico conteúdos de sobra para uma profunda avaliação do nosso ser ‘cristãos’ hoje. Hoje, talvez, tenhamos substituído os conteúdos/valores da realeza de Deus (liberdade, respeito, honestidade, justiça, paz,....) com a mastodôntica parafernália ritualística, normativa, canônica etc. que amiúde esconde as nossas incoerências, cumplicidades e ‘vazios éticos’ e existenciais.

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