sábado, 6 de março de 2010

O viticultor Jesus dá sempre uma nova chance à figueira estéril (Lc.13, 1-9)


Os paladinos da relação custo-benefício, - segundo a qual o custo jamais deve ser maior do que o benefício (entre outras possíveis combinações) - ficariam horrorizados com a conclusão do evangelho hodierno. Se, inicialmente, poderiam se animar com as atitudes rígidas e ‘racionais’ do senhor da figueira – por ele ameaçar de cortar a figueira estéril e exigir dela os ‘legítimos frutos’ – num segundo momento, poderiam ficar frustrados diante da atitude misericordiosa do viticultor que suplica mais um ano de cuidados e de paciente trabalho com a figueira para lhe dar novas chances produtivas. Dificilmente iriam compreender e aceitar o custo tão alto de manter uma figueira que não está produzindo frutos (benefícios)

Se os mesmos defensores dessa relação custo-benefício analisassem com oportuno distanciamento e imparcialidade o modelo econômico predominante hoje na sociedade global (genericamente definido de economia de livre mercado) deveriam arrancar do meio da sociedade todos aqueles ‘administradores, teóricos, presidentes, políticos, bancos e instituições’ que continuam insistindo na bondade de tal sistema. Os custos que a sociedade está pagando hoje, não somente para manter esse sistema, mas para tentar sobreviver apesar dele, é infinitamente superior aos benefícios que supostamente ele vem apregoando. Haveríamos que debater sobre o que entendemos por benefícios e custos no atual modelo econômico. Levar-nos-ia muito longe. Todavia, não podemos encarar a relação única e exclusivamente na sua acepção economicista.
O tal modelo econômico que supostamente cria novas oportunidades, desenvolvimento e bem-estar generalizado, ou seja, benefícios incalculáveis, vem produzindo de um lado situações de desigualdades abismais, desespero, fome, escravidão, insegurança existencial permanente e fracasso humano, e do outro lado, vem parindo uma nova cultura/mística mundial que lhe dá suporte, o alimenta e o perpetua. O modelo do livre mercado não criou somente paradigmas operativos, mas uma sua própria espiritualidade para que possa ser incorporado no ‘eu’ mais profundo de cada pessoa/consumidor.
É a partir de práticas consumistas e acumulativas que o novo fiel/cidadão cumpre as suas obrigações divino/idolátricas. Nisso se sente bem, se sente pacificado consigo mesmo e com o mundo. E, sobretudo, se sente reconhecido como gente, pois agora ao comprar e vender...pode quantificar e dar um preço monetário a tudo o que vê e toca! Podemos entender, com isso, por que apesar dos custos que o sistema econômico hegemônico produz – que são evidentes – ele continua seduzindo novos fieis. Ele vem inoculando o seu vírus espiritual de forma tão habilidosa e sutil que penetra no profundo da alma e não somente em comportamentos temporários. Ao chegar às profundezas da alma só uma conversão/mudança radical para reverter a nova situação de quem se entregou definitivamente ao novo ídolo.

Hoje, nós estamos contemplando e ‘colhendo’ a esterilidade de uma figueira que não vem cumprindo a sua missão de garantir bem estar para todos no ‘campo’ do senhor. Nós hoje podemos compreender as causas da esterilidade e da improdutividade da figueira. Podemos planejar ações de atenção paciente e carinhosa para com ela intervindo para que ela retome a produzir frutos de igualdade e solidariedade e dar sentido à sua existência no ‘oikos/habitat’ global.
O viticultor da comparação de Jesus ainda não se cansou de olhar com amor e afeto para a figueira estéril. Não cansou ainda de acreditar nela. Diferentemente do seu senhor, ainda não adotou a lógica do custo-benefício. Ele teima em apostar nela. Quem sabe, a sua fé e o seu amor desmedido para com aquela figueira poderá reverter a lógica e a relação custo/benefício adotada pelo seu senhor e desencadear na figueira uma nova e inédita capacidade de produzir frutos de equidade e justiça para todos os seres vivos.
BREVES DE AÇAILÂNDIA

Toda vez que visito esta cidade me deparo com verdadeiras situações-limite que atentam à nossa capacidade de compreender e aceitar.

A primeira.
Realizou-se ontem, dia 5, na Câmara dos vereadores de Açailândia, com a presença de representantes do Ministério Público, Assembléia Legislativa, Estado, instituições da sociedade civil uma audiência pública para tratar casos de violência e morte exercida por setores do Estado contra crianças e adolescentes desse município. A estratégia adotada foi a de colocar um elevado número de representantes dos órgãos competentes para falar com o intuito de ouvir suas versões, omissões e responsabilidades.
Dois adolescentes dessa cidade haviam sido executados sumariamente por policiais, no ano passado, ao fugirem das ‘masmorras’ reservadas aos adolescentes infratores, em São Luis. Sob custódia do Estado perderam a vida. Sem falar do caso de um outro menor morto dentro das dependências dessas unidades por um outro menor que tinha uma rixa antiga conhecida pelos próprios responsáveis. Nenhuma medida havia sido tomada até agora. Nem investigação, nem punição para os policiais pistoleiros do Estado. Na Comarca de Açailândia não há até hoje uma Vara específica que possa reunir as diferentes denúncias/processos contra menores infratores e dar seqüência com conhecimento de causa. Tudo é esfacelado e fracionado entre diferentes promotores que tomam medidas subjetivas, muitas vezes contraditórias, e sem que haja comunicação entre eles, inclusive quando há casos de reincidência. Está na hora de a Justiça começar a racionalizar e repensar sua atuação numa cidade que apresenta altos índices de violência praticada por menores e contra eles.

A segunda.

O sistema de saúde desse município está um verdadeiro caos há mais de dois anos. O secretário de Saúde é irmão do prefeito local. Um dos muitos parentes que ocupam cargos na atual administração. No CESP, hospital municipal faltam seringas, gazes, remédios básicos. As ambulâncias, somente duas para o município todo, estão sempre ocupadas e raras vezes livres para atender às solicitações. Há mais de ano setores da a sociedade vem denunciando o descaso com a saúde municipal mas o prefeito ignora e nem se justifica. Recentemente o promotor responsável determinou a abertura de um inquérito para verificar a aplicação das verbas específicas para a saúde, mas parece que o fez com bastante alarde para dar tempo, talvez, aos responsáveis de tamanha farra de ocultarem ou maquiarem provas. O município merece uma investigação federal!

Um comentário:

Antonio Soffientini disse...

oi claudio, só uma precisação. o secretário atual de saúde do município de Açailândia não é irmão do prefeito. todas as outras coisas são verdadeiras. com muita probabilidade aumentou o numero de ambulâncias funcionando.