quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Papa Francesco responde às perguntas do diretor de La Repubblica sobre relação entre fé e a realidade dos 'não crentes'

Coloco abaixo os principais trechos da carta de papa Francesco ao diretor Eugenio Scanfari de jornal La Repubblica que no dia 7 de agosto desse ano, no seu editorial, havia feito algumas perguntas ao próprio papa colocando as principais questões que um 'não crente' se põe ao longo da sua existência. 

".....Chegou agora o tempo, e o Vaticano II inaugurou justamente a sua época, de um diálogo aberto e sem preconceitos que reabra as portas para um sério e fecundo encontro. Permita-me citar-lhe, a propósito, uma afirmação a meu ver muito importante da Encíclica: como a verdade testemunhada pela fé é a do amor – sublinha-se – "resulta claro que a fé não é intransigente, mas cresce na convivência que respeita o outro. O crente não é arrogante; ao contrário, a verdade o torna humilde.Longe de nos enrijecer, a segurança da fé nos põe a caminho e torna possível o testemunho e o diálogo com todos" (n. 34). É esse o espírito que anima as palavras que eu lhe escrevo. É a partir dessa experiência pessoal de fé vivida na Igreja, que eu me sinto confortável para ouvir as suas perguntas e para buscar, junto com o senhor, as estradas ao longo das quais possamos, talvez, começar a fazer um trecho de caminho juntos. A fé cristã crê nisto: que Jesus é o Filho de Deus que veio para dar a sua vida para abrir a todos o caminho do amor. 
Por isso, o senhor tem razão, ilustre Dr. Scalfari, quando vê na encarnação do Filho de Deus o eixo da fé cristã. A encarnação, isto é, o fato de que o Filho de Deus veio na nossa carne e compartilhou alegrias e dores, vitórias e derrotas da nossa existência, até o grito da cruz, vivendo todas as coisas no amor e na fidelidade ao Abbá.
Chego, assim, às três perguntas que o senhor me faz no artigo do dia 7 de agosto. Acima de tudo, o senhor me pergunta se o Deus dos cristãos perdoa quem não crê e não busca a fé. Posto que – e é a coisa fundamental – a misericórdia de Deus não tem limites se nos dirigimos a Ele com coração sincero e contrito, a questão para quem não crê em Deus está em obedecer à própria consciência. O pecado, mesmo para quem não tem fé, existe quando se vai contra a consciência. Ouvir e obedecer a ela significa, de fato, decidir-se diante do que é percebido como bom ou como mau. E nessa decisão está em jogo a bondade ou a maldade do nosso agir. 
Em segundo lugar, o senhor me pergunta se o pensamento segundo o qual não existe nenhum absoluto e, portanto, nem mesmo uma verdade absoluta, mas apenas uma série de verdades relativas e subjetivas, é um erro ou um pecado. Para começar, eu não falaria, nem mesmo para quem crê, em verdade "absoluta", no sentido de que absoluto é aquilo que é desamarrado, aquilo que é privado de qualquer relação. Ora, a verdade, segundo a fé, é o amor de Deus por nós em Jesus Cristo. Portanto, a verdade é uma relação! Tanto é verdade que cada um de nós a capta, a verdade, e a expressa a partir de si mesmo: da sua história e cultura, da situação em que vive etc. Isso não significa que a verdade é variável e subjetiva, longe disso. Mas significa que ela se dá a nós sempre e somente como um caminho e uma vida. 

Na última pergunta, o senhor me questiona se, com o desaparecimento do ser humano sobre a terra, também desaparecerá o pensamento capaz de pensar Deus. Certamente, a grandeza do ser humano está em poder pensar Deus. Isto é, em poder viver uma relação consciente e responsável com Ele. Mas a relação entre duas realidades. Deus – este é o meu pensamento e esta é a minha experiência, mas quantos, ontem e hoje, os compartilham! – não é uma ideia, embora altíssima, fruto do pensamento do ser humano. Deus é Realidade, com "R" maiúsculo. Jesus no-lo revela – e vive a relação com Ele – como um Pai de bondade e misericórdia infinitas. Deus não depende, portanto, do nosso pensamento. 
.....Ilustre Dr. Scalfari, concluo assim estas minhas reflexões, suscitadas por aquilo que o senhor quis me comunicar e me perguntar. Acolha-as como a resposta tentativa e provisória, mas sincera e confiante, ao convite que nelas entrevi de fazer um trecho de estrada juntos. 

Com proximidade fraterna,
Francesco

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