sábado, 5 de abril de 2014

V Domingo de quaresma – Não há 'morte' para quem acredita na comunhão permanente entre irmãos e irmãs - (Jo.11, 1-45 )

Hoje nesse evangelho somos chamados a superar tudo o que aponta para a morte e acreditar que a vida é mais forte do que ela. E mais: acreditar que mesmo na morte física, da qual ninguém escapa, podemos e devemos continuar a viver em comunhão com aqueles que se separaram de nós fisicamente. Vamos descobrir e esclarecer alguns elementos dessa leitura que nos deixam intrigados:

1. Reparamos, de imediato, que a família de Lázaro não é uma família comum: não há pais, nem maridos, nem esposas. É, claramente, a própria comunidade cristã. João nos diz que nela não há superiores ou inferiores, nem patrão nem escravo, nem homem, nem mulher. Só irmãos e irmãs! Assim deveriam ser as nossas comunidades e famílias! No v. 6 Jesus toma conhecimento de que Lázaro está doente, mas em lugar de correr logo até ele demora ainda dois dias. Por quê? Nos vv. 25-26 Jesus promete que ‘quem crê em mim ainda que morra viverá, e quem vive e crê em mim não morrerá...’ Como prometer isso se todo dia fazemos a experiência da morte de cristãos, de pessoas de fé, do mesmo jeito que as demais que não creem? O que dizer diante disso? No v. 35 Jesus chora a morte do amigo, mas por que isso se ele sabe que vai ressuscitá-lo? Tudo isso poderia nos deixar um tanto desnorteados. Contudo, Jesus ao deixar Lázaro ‘morrer biologicamente’ quer dizer que ele não veio para impedir a morte física. Não é sua missão interromper o curso natural dos homens. Jesus não veio para eternizar a vida física, nem para operar ‘ressurreições de quem morreu fisicamente’, mas para nos oferecer a ‘vida que não acaba’, para dar sentido à nossa vida na sua integralidade, principalmente quando fazemos a experiência da morte física, a morte moral, o abandono e a solidão. 

2. Nos vv 17-27 João reproduz o diálogo entre Marta e Jesus. Jesus tenta fazer compreender o sentido da morte de um ‘irmão’, um amigo, uma pessoa querida que fazia parte da mesma comunidade de fé. Sabemos que a fé na Ressurreição é muito recente na bíblia, tanto é verdade que na época de Jesus muitos ainda a negavam. Marta faz parte daqueles que acreditam que a ressurreição irá acontecer só ‘no fim do mundo’. Isso parece ser, em geral, também o nosso pensamento. Ocorre que para Jesus não é assim: simplesmente o cristão que tem fé em Jesus não morre, embora morra biologicamente! Da mesma forma que acontece conosco quando, por exemplo, mudamos de lugar, deixamos a nossa terra, afetos, segurança, etc. De alguma forma, morremos. Mas ao mesmo tempo, no novo lugar recomeçamos uma nova vida, uma nova existência, novas relações. Para Jesus, o discípulo que morre, na realidade não morre, mas começa a fazer parte de uma nova vida. Não precisa esperar a ressurreição do ‘fim do mundo’! A pessoa já vive a plenitude da comunhão com Deus, agora! A vida não é tirada, mas é transformada. Nesse sentido, a morte para o cristão representa um novo nascimento. Como a lagarta que se transforma em borboleta. Deixa de existir como lagarta, mas ela mesma e não outra, inicia uma nova existência como... borboleta!
3. O choro de Jesus ao se aproximar do túmulo de Lázaro, ao constatar a perda do amigo, não é o choro desesperado (v33) de Marta e Maria e dos Judeus que lá estavam. João utiliza dois verbos diferentes: ‘choro desesperado’ que é o das irmãs e ‘as lagrimas desciam dos olhos’ para definir o choro contido, digno, nobre, de Jesus. Afinal, Jesus mesmo sabendo que Lázaro está com Deus, por um tempo ele não poderá vê-lo e nem tocá-lo fisicamente. A morte biológica não deixa de ser uma ausência que produz sofrimento. Mas é preciso retirar a pedra, pois não pode existir mais separação entre os ‘vivos e os mortos’. De fato, os mortos que creram continuam a viver. Vivem nos gestos, nas palavras, no testemunho daqueles que continuam a amá-los. Não há razão tampouco de mantê-los separados, confinados ou amarrados num cemitério ou em frios túmulos. É um convite a quantos não querem deixar partir seus irmãos e irmãs que morreram biologicamente a deixá-los ir. Ao deixá-los ir não significa que serão esquecidos. Acreditem que agora, por estarem vivos em Cristo, eles continuam livres conosco e com Deus sem as amarras e sem os condicionamentos terrenos. A catequese de João aos catecúmenos é para conscientizá-los, na verdade, de que eles ‘morrem’ para o mundo, mas ‘renascem’ a vida nova ao entrar na comunidade dos ‘amigos’ de Jesus. Formando família com outros irmãos e irmãs. Uma vida que não acabará nunca e que nunca perderá de sentido!

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